Estão dizendo que Bush ganhou as eleições nos Estados Unidos por causa dos “valores morais”. Foi reeleito porque é contra o casamento de homossexuais, aborto, e outras coisas que os americanos conservadores defendem. Dizem até que foi o “fundamentalismo religioso” que o ajudou na derrota de Kerry, transformando Bush num enviado de Deus na guerra contra o mal – agora legitimado para mais quatro anos. Além disto, ele teria se tornado o vingador do 11 de setembro na missão contra o terrorismo mundial. “É o eleitorado que anda com a Bíblia nas mãos quem mais deseja ver o sangue esguichar, são eles os maiores entusiastas do Império da Vingança”, conclui o historiador gaúcho Voltaire Schilling (Zero Hora, 6/11/04).
Não dá pra negar que o jeito de Bush defender os valores morais da Bíblia mais atrapalha do que ajuda. São muitas contradições. Por exemplo, quando um dos valores da Bíblia é a verdade, parece que este foi derrubado junto com as torres gêmeas, já que a guerra contra o Iraque permanece justificada e defendida com mentiras. Luis Fernando Verrissimo, em seu artigo “valores morais” (Zero Hora, 8/11/04) vai mais longe e ironiza dizendo que os eleitores de Bush e opositores do aborto poderiam, quem sabe, se sensibilizar, se encontrassem alguns fetos entre os mais de 100 mil civis mortos no Iraque. E agora?
Jesus também defendia os valores morais, mas mesmo assim desaprovou a “guerra santa” dos fariseus. E se hoje os cristãos continuam sendo convocados pelo mesmo Salvador para serem testemunhas dele até nos lugares mais distantes da terra (Atos 1.8), até agora ainda não foram chamados para serem nem advogados de Deus nem juízes dos homens. Aliás, “não julguem para não serem julgados”. Nós sabemos quem disse isto. Parece que este é o problema do Bush político impropriamente misturado com o Bush religioso, ao se intrometer num “lugar pagão” como juiz de Saddam. Se a missão cristã é ir por todo o mundo e pregar o Evangelho, então, nesta mistura de Constituição com Bíblia, isto agora está comprometido como no tempo das Cruzadas e inquisições.
Na verdade, antes de valores morais como casamento, família, princípios contra o aborto etc, vem o amor. E este primeiro valor não se ensina numa guerra, por regras e leis, pregações e campanhas moralistas. Isto nem se ensina. Era “ensinado” no tempo da “antiga aliança”, numa teocracia. Mas “está chegando o tempo em que farei um novo acordo”, diz Deus 600 anos antes dele ser firmando na cruz. “Esse acordo não será como o que eu fiz com os seus antepassados (nas tábuas dos Dez Mandamentos)… Eu porei a minha lei nas suas mentes e a escreverei em seus corações… Ninguém vai precisar ensinar o seu amigo nem o seu parente, dizendo: procure conhecer ao Deus Eterno … Pois eu perdoarei os seus pecados e nunca mais me lembrarei das suas maldades. Eu, o Deus Eterno, falei” (Jeremias 31.31-34). Mais tarde, ensinando porque podia ensinar, Jesus lembrou que os cristãos são sal da terra e luz do mundo (Mateus 5.13,14), exatamente para indicar esta verdade, que o sal não ensina mas salga, a luz não ensina mas ilumina – que o cristão não prega a moralidade, mas vive a moralidade. Ou como disse o Mestre, “assim também a luz de vocês deve brilhar para que os outros vejam as coisas boas que vocês fazem e louvem o Pai que está no céu” (v.16).
Pois, se hoje os valores morais estão “caindo fora de moda”, quem sabe seja por aquilo que disse Jesus, que nos últimos tempos “a maldade vai se espalhar de tal maneira, que o amor de muitos esfriará” (Mateus 24.12). Melhor então, é seguir a recomendação dele, que mandou Pedro guardar a espada pois se precisasse de ajuda pediria logo ao Pai doze exércitos de anjos (Mateus 26.53). Uma recomendação de ficar firme no amor até o fim – sem responder o mal com o mal, para que o Evangelho seja anunciado no mundo inteiro “como testemunho para toda a humanidade” (Mateus 24.13-14). Bem mais fácil do que ser juiz ou advogado dos valores morais.
Autor: Pastor Marcos Schmidt – marsch@terra.com.br