Através de uma velha lenda árabe, conta-se que um homem que trabalhava o dia todo em seu moinho, certa tarde, muito cansado, voltou para a sua barraca.
Ali tomou um banho refrescante, preparou sua refeição e depois de alimentado,
sem ter com quem conversar, tomou uma xícara de chá fumegante,
estendeu cuidadosamente a sua esteira a um canto da barraca e se deitou ao lado do braseiro.
O frio era intenso, porém o homem, depois de bem agasalhado, encolheu-se na esteira e dormiu.
Algumas horas se passaram e de repente, ao ouvir um ruídoestranho e sentindo que as paredes da barraca oscilavam, movendo-se de um lado para outro, o homem despertou em sobressalto.
Acendendo o lampião, ele viu com surpresa a cabeça de um camelo dentro da barraca.
Antes de tomar qualquer atitude a fim de afastá-lo dali, o camelo suplicante falou:
-“Lá fora o frio está insuportável…permita-me esconder tão-somente a minha cabeça dentro da sua barraca.
Prometo não incomodá-lo e nem proceder inconvenientemente.”
O homem pensou por um pouco.
Considerou então que o cameloestava certo, porque lá fora estava realmente muito frio.
Assim deduzindo, o homem permitiu que ele continuasse com a sua cabeça escondida dentro da barraca.
Depois de entendidos, o árabe voltou para a sua esteira, na tentativa de dormir e se refazer a fim de enfrentar a luta no outrobdia.
Tão logo se acomodou, continuou a sentir que a barraca continuava oscilando… movimentando-se lentamente…
Intrigado sentou-se na esteira e que quadro estúpido!
Nem podia acreditar no que via: o atrevido animal já havia metido todo o corpo para dentro da barraca…
O espaço de que dispunha era pequeno demais para os dois e, assim, era impossível continuar.
Sentindo-se prejudicado, o homem reclamou, exigindo que o camelo se afastasse porque o que eles haviam combinado não era aquilo.
A permissão foi dada apenas para a permanência da cabeça e não para o tronco e os membros…
Muito bem instalado e se sentindo à vontade, o camelo retrucou, com ironia: “Os incomodados que se mudem. Estou muito bem aqui.”
Há pecados na vida do homem que, como o camelo dessa lenda, só reivindicam um lugarzinho obscuro no coração, mas, quando ingênua ou voluntariamente lhe cedem, ele vai penetrando cuidadosamente, pouco a pouco, até conseguir ocupar toda a área disponível em cada coração, sem depois aceitar sair.